Pequena vida a nossa
Terra: o mundo.
Terra. Foi este o nome que demos a esta bola imperfeitamente perfeita que habitamos. Se veio do pó ou se Deus a fez, não sei responder, mas andamos cá a usar desta casa a céu aberto e isso interessa-me mais do que saber quem a fez.
Do céu que a Terra vê, vê-se os seus mares, as suas terras, as suas nuvens. Sim, seus e suas, porque só cá se veem como são. E são belos.
Cá de dentro vemos as veias do mundo, os seus pulmões, a sua carne gasta e mutilada e sentimo-nos as bactérias que o fazem ser assim. As cascatas correm e nós corremos atrás procurando o que nos podem dar em troca; as árvores abanam e nós abanamo-las para delas tirar proveito; a terra treme e fazemo-la temer para dissecar de si o que achamos que irá render.
O mundo, esta bola imperfeita que nos acolhe, já foi diferente.
Surgimos do nada, dizendo nada, sabendo nada, tendo tudo. Hoje, temos tudo, dizendo tudo e sabendo nada.
E os outros filhos da Terra? Esses são nossos irmãos, mas não têm o que dizer porque não dizem como nós. Se esta casa fosse só deles, estaria limpa, arrumada e sempre bem cuidada, mas nós também somos de cá. Tantos irmãos matámos que uns já nem por cá andam e outros ir-se-ão embora se assim continuar. O mundo não é nosso, mas é.
No fundo, andamos para trás e para a frente procurando contacto com o mundo, com a Terra. Mas esse é fingido e quem finge é o poeta. Nós, seres carnais e finitos, enfim, banais, demos cabo do que nos protege, do que nos começa e finda, do que nos dá a vida à vida. Pensemos nos nossos irmãos, nas veias do mundo, na sua carne velha, gasta e podre, porque precisamos dela para dizer que a mataremos, porque o nosso ego é tão grande que, até para fazer o bem, temos de fazer mal.
Faremos de tudo para te salvar de nós, mas prometemos que te mataremos no fim.
Escrito a 14 de dezembro de 2025 por Francisco Ambrósio


