Atlas da mocidade
As aventuras d'infância.
Ainda ontem era hoje, e amanhã será outra vez.
Deitei-me menino e acordei homem, mas não me recordo do que sonhei nesse longo sono para sê-lo hoje.
O Atlas da nossa vida é cada momento que vivemos. Mas viver não é pensar.
A última coisa que me lembro de ter feito antes de me deitar para este sono profundo que tomei, enquanto menino, é de ter cheirado, sentido, ouvido e saboreado todas as palavras do livro de aventuras que lia todas as noites.
Mas hoje não sei desse grande livro que lia, que tinha tantas páginas, mas quase todas em branco.
Hoje ando sempre com uma enciclopédia atrás da alma. Deito-a junto de mim, na mesa de cabeceira, onde dorme a consciência.
Levanto-me perto da manhã todos os dias, e anoto tudo o que vivi no hoje de ontem na minha enciclopédia.
Mais tarde, quando cá já não tiver o corpo, quero ler cada passagem do que haviam escrito no meu pequeno livro de aventuras. Para a cova, com o corpo, irá a grande enciclopédia que é — será — a vida que tomo.
Mas, tal como o meu livro de aventuras, quero reler cada passagem do que não me lembro de ter escrito.
Darei por mim, decerto, a ler e ler outra e outra vez cada momento, mas sem nunca esquecer as “aventuras de infância”.
O título que escolho para a minha enciclopédia é apenas “hoje”, porque foi o dia mais longo da minha vida.
Escrito a 30 de novembro de 2025 por Francisco Ambrósio.


